Microbiologia: MARSA/MRSA

15/07/2009 22:38

 

Controle das infecções nosocomiais causadas por MRSA e MARSA.

CLÍNICA MÉDICA

RECOMENDAÇÕES PARA O CONTROLE DE INFECÇÕES NOSOCOMIAIS POR STAPHYLOCOCCUS AUREUS RESISTENTES À METICILINA[1] (MRSA) E À METICILINA E AMINOGLICOSÍDEOS (MARSA)
Francisco de Assis Fioravanti
[2]; Leonardo Frajhof[3]; César Filipone[4];
Claude André Solari
[5];Maria Inês Klôh[6]; Norma Helena Friedman[7]
.

 

·        Resumo

        Apresentamos as recomendações adotadas no Hospital Universitário Gaffrée e Guinle/UNIRIO, visando ao controle das infecções nosocomiais causadas por MRSA e MARSA.

·        introdução

        Uma média de 20% ou mais dos funcionários de saúde são portadores nasais de Staphylococcus aureus, porém a colonização maior se dá na camada superficial da pele.

        No início de década de 60, tivemos como importante causa de infecção hospitalar esta estafilococcia. Uma vez que estes microrganismos são introduzidos na instituição, tornaram-se difíceis de serem erradicados. Pacientes infectados geralmente requerem tratamento com VANCOMICINA, um agente mais caro e relativamente mais tóxico que antibióticos usados para tratar infecções causadas por Staphylococcus aureus sensíveis à oxacilina.

        Os Staphylococcus aureus podem ser divididos em quatro categorias principais:

a) amostras sensíveis à penicilina;

b) amostras resistentes à penicilina, sensíveis à oxacilina e cefalosporinas;

c) amostras resistentes à oxacilina (MRSA);

d) amostras resistentes à oxacilina e aminoglicosídeos (MARSA).

        Staphylococcus aureus resistentes à oxacilina devem ser considerados resistentes às cefalosporinas. A maioria das amostras é também resistente à eritromicina, clindamicina, tetraciclinas e aminoglicosídeos (MARSA).

·        Epidemiologia

        As infecções causadas por Staphylococcus aureus (MARSA) e (MRSA) ocorrem primariamente em hospitais terciários. A transmissão desses estafilococos entre os hospitais pode ocorrer quando os pacientes infectados ou colonizados são transferidos de uma instituição para outra, ou colonizando a equipe hospitalar que trabalha em mais de uma instituição. Os pacientes podem permanecer colonizados por muito tempo (+ de um ano), e são capazes de re-introduzir germe na readmissão.

        A principal via de transmissão dos Staphylococcus aureus resistentes dentro de hospitais é a disseminação de um doente para outro através das mãos do pessoal hospitalar. A transmissão por aerossóis ou via aérea é mais provável de ocorrer em Centro de Queimados, onde pacientes acidentados e colonizados por Staphylococcus aureus podem levar à produção de aerossóis e contaminação de superfícies ambientais.

        Aproximadamente 1 a 6% do pessoal envolvido em cuidados de pacientes com MRSA e MARSA pode carrear o microrganismo na narina anterior por período de tempo variável. A taxa de portadores nasais e funcionários de Centro de Queimados expostos a pacientes com MRSA e MARSA tem sido de 16 a 24%. O pessoal hospitalar que porta Staphylococcus aureus na região nasal pode transmitir estes organismos para pacientes por meio de aerossóis, mas raramente esta transmissão tem sido documentada em surtos de MRSA e MARSA. Pessoal hospitalar colonizado, apresentando dermatite ou paroníquia, tem maior possibilidade de transmitir o organismo para o paciente.

        Os maiores reservatório de MRSA e MARSA dentro dos hospitais são os pacientes infectados e/ou colonizados. Fatores de risco têm sido associados com aquisição de MRSA e MARSA em ambiente hospitalar, tais como: longa hospitalização, terapia antimicrobiana prolongada, proximidade de pacientes colonizados ou infectados com MRSA e MARSA. Pacientes colonizados em UTI Neonatal, CTI ou Centro de Queimados têm maior risco de adquirir MRSA e MARSA.

        Em hospitais onde os Staphylococcus aureus resistentes à oxacilina são prevalentes, aproximadamente, 30 a 60% dos pacientes colonizados desenvolvem uma infecção.

·        Medidas Gerais de Controle

Vigilância. Freqüente avaliação do resultado das culturas do laboratório de microbiologia;

- Identificar prontuários de pacientes colonizados ou infectados com Staphylococcus aureus resistentes à oxacilina;

- Periódicas culturas de pacientes hospitalizados com maior risco de adquirir MRSA e MARSA em casos de: ferida cirúrgica, tubo endotraqueal, traqueostomia, queimados ou outras lesões cutâneas extensas;

- Na readmissão, estes pacientes que foram identificados deverão ser tratados com normas de isolamento e aplicação de soluções anti-sépticas, conforme recomendações em anexo, até o resultado das culturas nasais;

- Usar luvas para o manuseio e lavar as mãos antes e após retirar as luvas;

- Usar máscaras quando em contato com o paciente com comprometimento pulmonar.

·        Rotina para Controle e Tratamento de Portadores de MRSA e MARSA

Para todos os pacientes procedentes de outras instituições hospitalares:

- Colher swab nasal, de ferida e secreções no ato de admissão na enfermaria;

- Fazer descolonização corporal com gluconato de clorhexidina a 4%, duas vezes ao dia, durante três dias consecutivos, até o resultado da cultura;

- Manter em isolamento de contato os pacientes com comprometimento respiratório;

- Notificar a C.C.H.I. os casos confirmados;

- Incentivar o hábito de lavar as mãos freqüentemente.

 Para os casos de cultura positiva de MRSA e MARSA:

- Lavar as mãos antes de iniciar os trabalhos e manipulação do paciente, lembrando que o uso de luvas dá a falsa sensação de proteção, a técnica não deve ser esquecida;

- Fornecer ao paciente solução de gluconato de clorhexidina a 4% para uso durante os banhos de aspersão, ou no leito, 2 vezes ao dia, durante 5 dias;

- Nas lesões cutâneas, feridas cirúrgicas, cavidade nasal e axilas, aplicação tópica de mupirocina a 2%;

- Educar o paciente portador de MRSA/MARSA quanto a não circular pela enfermaria, não sentar no leito de outros pacientes e lavar as mãos freqüentemente (permanecer o maior tempo possível em seu leito);

- Controlar o fluxo de pessoal, orientar as visitas a não usar pratos, talheres, objetos e roupas dos pacientes;

- Orientar para não sentar no leito do paciente;

- Evitar que algum membro da equipe de saúde portador de dermatites e/ou outras infecções cuidem de pacientes com MRSA/MARSA;

- Incentivar o hábito de lavar as mãos.

·        Limpeza e Desinfecção

- Proceder a limpeza concorrente, lavagem diária da Unidade do paciente com água e sabão, usando hipoclorito de sódio a 1% em presença de secreção orgânica.

- Proceder a DESINFECÇÃO TERMINAL (alta, óbito ou transferência), aplicar após a limpeza (com água e sabão) solução de hipoclorito de sódio a 1% em superfícies, mobiliários e equipamentos, deixando por 10 minutos, enxaguando em seguida.

- Fazer DESINFECÇÃO DO MATERIAL utilizado para sustentação do paciente, como micronebulizadores, respiradores, inaladores, etc, com hipoclorito de sódio a 1% por 30 minutos. Nos casos de patologias respiratórias graves, substituir o hipoclorito por glutaraldeído, e em ambos os casos, enxaguar abundantemente com água corrente e secar.

- Desinfetar materiais que entrem em contato direto com o paciente, usando álcool a 70%, fazendo fricção, esperar, secar e repetir por mais 2 vezes este mesmo processo. Exemplo de materiais:

- Citoscópios (cabos e cones);

- Laringoscópios (cabos e lâminas sem lâmpada);

- Partes metálicas de incubadoras;

- Pratos de balança;

- Termômetros;

- Estetoscópios;

- Eletrodos;

- Outros.

·        Cuidados com Roupa e Lixo

         As roupas e o lixo devem ser acondicionados separadamente em sacos plásticos   amarrados para serem transportados e rotulados “CONTAMINADOS”.  Deve-se proceder a lavagem e desinfecção dos carrinhos de transporte de descarte diariamente.

·        Transporte de Paciente para Exame

- Fornecer máscara para o paciente portador de patologia respiratória.

- Transportar de cadeira de rodas para evitar disseminação com a deambulação.

- Orientar o paciente quanto aos cuidados e a lavagem das mãos.

- Transportar crianças usando máscara e avental.

- Orientar os profissionais que realizarão os exames sobre o estado do paciente, para as devidas precauções específicas do local onde será feito o exame e cuidados posteriores.

- Fazer a desinfecção imediatamente (ao voltar do exame) com hipoclorito de sódio a 1% em toda a superfície, deixando por 10 minutos, enxaguando após (cadeira de rodas, maca, carrinho, etc.).

- Incentivar o hábito de lavar as mãos.

·        Orientação ao Paciente

        Promover educação do paciente para evitar disseminação e contaminação acidental de superfícies e objetos.

- Orientar sobre a lavagem das mãos ao sair do banheiro, ao alimentar-se a após contato direto ou indireto com sangue e secreções em geral.

- Não sentar no leito de outro paciente.

- Não trocar ou emprestar objetos, roupas, livros a outros pacientes ou funcionários.

·        Orientação ao Funcionário

        Proceder às seguinte medidas profiláticas e de controle:

- Se tiver contato direto com lesões ou secreções de pacientes com MRSA/MARSA positivos, e apresentarem dermatites e/ou sintomatologia compatíveis com a infecção, colher swab nasal e, enquanto aguardam o resultado, devem proceder a descolonização com clorexidina a 4%.

- Notificar a C.C.I.H. qualquer resultado da cultura nasal, positiva ou negativa.

- Incentivar o hábito de lavar as mãos.

OBS: os funcionários só deverão ser afastados em casos especiais, como por exemplo, pneumonias, infecções de pele com secreções e grandes drenagens, etc.

·        Infecções Estafilocócicas na Unidade Neonatal

·         Medidas em casos de surtos ou epidemias

- Raramente o recém-nascido adquire S. aureus de sua mãe durante o nascimento, mas, facilmente, coloniza-se no berçário, onde existem crianças já colonizadas. Em geral, esta colonização se inicia no coto umbilical, disseminando-se na pele e mucosa nasal, através das mãos dos profissionais que manipulam a criança e objetos contaminados.

- Infecções triviais no profissional, na puérpera ou no RN têm grande importância epidemiológica no berçário. Dentre as infecções, convém ressaltar a conjuntivite, a furunculose, a dermatite, a mastite, a artrite séptica e a amigdalite, entre outras. Um portador pode também estar presente na sala de parto ou no alojamento conjunto.

- Pode-se presumir epidemia se houver ocorrência de infecção cutânea em dois ou mais RN simultaneamente, em um período curto.

·        Medidas Profiláticas

Gerais. Manter o RN no alojamento conjunto aos cuidados da mãe, para orientação e incentivação ao aleitamento materno.

Específicas. Lavagem rigorosa das mãos, preferencialmente com PVP-I (degermante) ao iniciar o trabalho, após sair do banheiro, após cuidar de RN portador de qualquer infecção.

- Controle e educação do portador, profissional e visitantes.

- Afastar do berçário pessoas com infecções diversas, como herpes, febres, piodermites, etc, até o final do tratamento.

- Precauções especiais com o RN de mãe infectada, que poderá ser amamentado 48 horas após antibioticoterapia eficaz; orientar a puérpera sobre lavagem das mãos, cuidados especiais com o RN e vigilância do mesmo após alta hospitalar. Nenhum RN do alojamento conjunto deve ser levado para o berçário.

- Controlar o fluxo de pessoal no berçário e alojamento conjunto, não permitindo que visitante carregue RN no colo.

- Usar avental de mangas curtas (mangas curtas facilitam a lavagem das mãos e do braço, evitando a contaminação das mangas).

- Manter unhas curtas, cabelos presos e evitar uso de objetos ornamentais.

- O pessoal que cuida de RN colonizado por S. aureus deve lavar as mãos com sabão, após a retirada das luvas de procedimento.

- O RN colonizado ou infectado por S. aureus deve ser separado da mãe devendo-se ser utilizadas precauções de isolamento de contato. A criança que apresenta infecção respiratória por S. aureus libera aerossóis contendo Staphylococcus no ambiente. Os RN isolados deverão ser assistidos por pessoal exclusivo.

- Suspender as admissões, utilizar o sistema de corte, isto é, colocar os RNs admitidos num período de 48 horas em única área (exceto os comprovadamente infectados), assistidos por pessoal exclusivo, e não admitir outros RNs até que sejam dadas altas, para posterior limpeza e desinfecção da unidade.

- Detectar os portadores através de estudos microbiológicos.

- Orientar o pessoal sobre as medidas de controle.

- Lavar as mãos sempre que entrar, manusear e sair do local isolado, até que o surto seja debelado.

- Para os RNs com colonização umbilical indica-se a aplicação de mupirocina a 2%, para evitar a colonização em outras partes do corpo.

- Manter vigilância e controle das mães infectantes.

- Desinfecção concorrente e terminal devem ser feitas com água e sabão e hipoclorito de sódio a 1%.

OBS: a clorhexidina reduz a colonização estafilocócica e, subseqüentemente, a infecção, porém não deve ser usada por muito tempo (além de duas semanas), porque, eliminando a flora normal da pele, pode favorecer a colonização por bacilos Gram-negativos.

·        Orientação aos médicos

- Preencher corretamente os pedidos de exames laboratoriais (culturas), para evitar duplicidade de pedidos.

- Prescrever antibióticos aos pacientes, baseados em resultados de cultura, objetivando a terapia de uma infecção com agente etiológico e perfil de sensibilidade aos antimicrobianos conhecidos.

- Incentivar o hábito de lavar as mãos.

·        Orientação para os Visitantes

        Somente poderão entrar no quarto ou enfermaria sem meios de proteção (máscara, avental, luvas), quando autorizados.

- Seguir as orientações de isolamento quando for recomendado.

- Evitar trazer crianças ao hospital; elas não sabem se proteger das infecções.

- Evitar jogar cascas de frutas, lixo ou roupas fora do local apropriado; pois são fontes de insetos, devem ser colocados em  sacos plásticos,  jampers ou lixeiras próprias.

- Retirar anéis, pulseiras e relógio quando visitar o paciente; facilitar a lavagem das mãos e evitar que estes se contaminem.

- Lavar as mãos ao chegar ao quarto ou à enfermaria.

- Evitar hospitalização por comodidade pessoal; sempre que for possível, faça tratamento domiciliar com orientação médica.

- Evitar sentar na cama do paciente; você traz contaminação da rua e leva contaminação para casa ao sentar na cama.

- Não trazer alimentos; só com autorização médica ou da enfermagem (respeitar a dieta).

- Não dar nenhum tipo de medicação.

- Não tocar nos aparelhos e materiais usados pelos pacientes.

- Comunicar imediatamente à equipe de enfermagem se notar a presença de sangue, fezes, urina ou escarro ou outras secreções no chão. Não tente limpar. Existe pessoal treinado para esta tarefa.

- Orientar aos visitantes que, chegando ou saindo do hospital, lavem as mãos.

·        Tipos de Isolamento

        Na impossibilidade de isolar o paciente em quarto próprio, deve-se manter:

o       Isolamento de Contato

        Impede a transmissão de infecções altamente contagiosas ou de infecções epidemiologicamente importantes, que se propagam através do contato direto com a fonte de infecção.

- Pacientes infectados com as mesmas cepas podem compartilhar o mesmo ambiente.

- Usar sempre luvas de procedimentos para contato com o paciente e/ou material contaminado.

- Usar sempre máscara e avental se houver contato direto com o paciente e/ou material contaminado.

- Desprezar todo material descartável e enviar material reutilizável para reprocessamento em saco plástico com rótulo CONTAMINADO, principalmente em presença de secreções orgânicas.

- Incentivar o hábito de lavar as mãos.

o       Isolamento respiratório

        Impede a transmissão de doença respiratória a curta distância, através do ar (transmissão por gotículas), mediante contato direto ou indireto. Afastar paciente com infecção respiratória de pacientes imunodeprimidos, lactentes, idosos ou outros suscetíveis a infecções respiratórias.

- Pacientes com o mesmo organismo infectante podem compartilhar o mesmo ambiente.

- Utilizar máscara descartável quando estiver cuidando do paciente.

- Usar luvas e avental se houver contato direto com o paciente ou secreções brônquicas.

- Desprezar todo material descartável e enviar o material reutilizável para reprocessamento em saco plástico rotulado CONTAMINADO.

- Incentivar o hábito de lavar as mãos.

 

·        Referências Bibliográficas

1. TAVARES, C. Manual de Infecções Hospitalares – Prevenção e Controle. CCIH da UFMG, Editor MEDSI, 1993.

2. BEAVER, P. C. Clínica de Doenças Infecciosas da América do Norte. 12a ed. Interlivros, 1995.

3. SOARES, M. T.; DAVIDSON, E. Orientação da CCIH do HUPE para Prevenção e Controle de MARSA, 1994.

4. BOYCE, J. M. Epidemiology and prevention of nosocimial infections. In: CROSSLEY, K. B.; ARCHER, G. L.; eds. The staphylococci in human diaease. New York: Churchill Livingstone, 1997: 309-29.

5. STEINBERG, J. P.; CLARK, C. C.; HACKMAN, B. O. Nosocomial and community-acquired Staphylococcus aureus bacteremias from 1980 to 1993: impact of intravascular devices and methicillin resistance. Clin Infect Dis 1996; 23: 255-259.

6. LOWY, F. D. Staphylococcus aureus infections.  N Engl J Méd 1998; 339: 520-532.

7. SMITH, T. L.; PEARSON, M. L.; WOLCOX, K. R.; et al. Emergence of vancomycin resistance in Staphylococcus aureus. N Engl J Méd 1999; 340: 493-501.

 

 

COMPLICAÇÕES TRANSFUSIONAIS[8]
Leonardo Viana Coutinho

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